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População indígena

Antropologia e particularidades 

Os grupos que atualmente fazem parte da população indígena no Brasil, são aqueles que restaram ao longo processo ao qual foi submetida a população ameríndia, a partir do “descobrimento” do Brasil. Esse processo levou ao contato entre etnias e resultou no aculturalismo, subordinação e dizimação de muitos índios. Estima-se que antes da chegada dos europeus no Brasil, havia aproximadamente de 2 a 2,5 milhões de índios (100% da população em território próprio). Hoje, segundo o Censo de 2010 (IBGE), a população índigena é de 896.917 (0,47% da população brasileira). Essa redução além de numérica foi também territorial, que um dia era totalmente desses povos. A constituição Federal Brasileira, garante, entre outras coisas, o território como forma de compensar todo o sofrimento que esses povos tiveram até hoje

O conceito de índio: Segundo Darcy Ribeiro, indígena é, no Brasil de hoje, essencialmente aquela parcela da população que apresenta problemas de inadaptação à sociedade brasileira, em suas diversas variantes, motivados pela conservação dos costumes, hábitos ou meras lealdades que a vinculam a uma tradição pré-colombiana. Ou, ainda mais amplamente: “índio é todo o indivíduo reconhecido como membro por uma comunidade pré-colombiana que se identifica etnicamente diversa da nacional e é considerada indígena pela população brasileira com quem está em contato”.

Diversidade: grande parte da gigantesca diversidade étnica e linguística que o Brasil possui é por conta da pluralidade indígena. Segundo o IBGE, existem 305 etnias indígenas (comunidades definidas por afinidades linguísticas, culturais e sociais), das quais a maior é a Tukúna, com 6,8% da população indígena. Também foram identificadas 274 línguas, sendo que entre as crianças de cinco anos ou mais 76,9% falam português, além da sua língua de origem. No que diz respeito à identidade étnica, as mudanças ocorridas em várias sociedades indígenas, como o fato de falarem português, vestirem roupas iguais às dos outros membros da sociedade nacional com que estão em contato, utilizarem modernas tecnologias (como aparelho de televisão, celular ou computador), não fazem com que percam sua identidade étnica e deixem de ser indígenas.

Influência na formação da cultura nacional: apesar da colonização europeia ter praticamente destruído a população indigena fisicamente (guerras, escravidao) e culturalmente (catequese, miscigenação com outras etnias) a cultura e conhecimentos dos povos indígenas tiveram um papel importante na formação da língua, culinária, folclore e uso de objetos no que conhecemos hoje como brasil. Todavia, os impactos da colonização foram brutais e apenas alguns grupos indígenas conseguem manter suas tradições atualmente. 

 

Proteção aos índios: os índios eram vistos pelos colonizadores como mão de obra de fácil acesso e para isso utilizavam da catequese como método de evangelização e posterior escravização dos nativos. A partir da justificativa de humanização e civilização dos ditos “selvagens”, os jesuítas tornaram possivel a escravidão dos indígenas, porém ficavam  sob a jurisdição dos padres e da coroa.  Já no século XIX José Bonifácio de Andrada e Silva defende princípios de justiça, esses princípios serviram de alicerce para o início de uma política humanitária em relação aos índios. Posteriormente, em 1910, foi criado o SPI (Serviço de Proteção ao Índio) o qual teve base nas ideias de Bonifácio. Esse serviço tinha caráter humanístico, e visava à proteção do indígena e assistência, garantindo a posse de seus territórios, direitos civis (respeitando sua condição de índio), entre outras coisas. Devido a má gestão do SPI, em 1967 ele chegou ao fim e após sua extinção foi criada a FUNAI (Fundação Nacional do Índio), que a exemplo do antigo projeto, não vem cumprindo com objetivo, e muitas vezes vemos até benefícios em detrimento dos que deveriam ser os maiores beneficiados, os próprios índios brasileiros.

Etnocentrismo: os povos nativos não eram vistos como humanos pelos seus colonizadores e muitas vezes eram colocados como “selvagens” ou “pagãos”. Mesmo com a proclamação da sua humanização no século XVI pelo papa paulo III, a designação para se referir ao índios nunca deixou de ter caráter pejorativo Muito disso se deve à associação do índio a um ser sem alma (justamente numa época impregnada de cristianismo), caracterizando etnocentrismo seja no passado ou no presente. O encontro entre a cultura dominante e a minoria deu origem ao processo de aculturação em que se favoreceu os colonizadores em detrimento dos colonizados.
Hoje apesar de direitos conquistados, os povos indígenas dependem muitas vezes de organizações não governamentais (brasileiras ou estrangeiras) para ajuda-los a manter minimamente o respeito e o cumprimento de normas previstas em seu favor. Infelizmente, assim como no período de colonização, hoje o índio é visto como um intruso em sua própria casa, pelos que só conseguem enxergar dinheiro em potencial nas suas terras.
O Brasil, desde sua “descoberta” teve os recursos naturais explorados, seja pelos colonizadores, durante o período colonial, seja por fazendeiros, mineradores e madeireiros, atualmente. Isso resulta em uma relação de confronto com os povos indígenas, visto que muitas vezes ocorrem ataques e tentativas de apropriação de terras indígenas pelos grandes fazendeiros. Os exploradores não enxergam os índios como povos com uma rica cultura e que merecem respeito como sendo os verdadeiros descobridores das terras brasileiras. O que eles enxergam é um obstáculo que deve ser vencido, seja por meios amigáveis ou não. 

Preservação indígena: Desde o início da colonização os povos indígenas perderam terras e eram claramente desfavorecidos nos conflitos com os colonizadores. Além disso, mais recentemente na história brasileira, houve um segundo momento de grande perda de terras indígenas com a “marcha para o oeste” incentivada durante o governo Vargas. Nesse período foi concedido títulos legais de terras à quem quisesse se dispor a produzir em favor da agro economia do país, contribuindo geograficamente para a ocupação e desenvolvimento do interior do país, mas essa ocupação implicou diretamente no aumento dos conflitos entre agricultores e índios.

Tais conflitos foram em grande parte ignorados e em certos casos tiveram até o apoio do governo em favor de exploradores contra indígenas, especialmente no período ditatorial, em que os indígenas eram preconceituosamente esquecidos e até oprimidos pelos governos que buscavam a todo custo medidas desenvolvimentistas.  

Atualmente os conflitos entre índios e não índios está em maior evidência (principalmente no que diz respeito à demarcação e exploração de terras indígenas) visto que após os anos de opressão resultantes da ditadura, agora os índios conseguem lutar (conjuntamente com organizações não governamentais e institutos protetores) pela garantia de seus direitos que são garantidos pela constituição federal. 

Segundo o jurista Dallari, ultimamente os grupos econômicos que estão ligados ao agronegócio estão cobiçosos em relação a territórios indígenas. E nesse sentido o senado têm tido papel negativo em relação aos índios, chegando a interferir em governos estaduais dificultando a manutenção dos direitos concebidos pela Constituição Federal. Exemplo disso é a PEC 215 que busca transferir demarcações de terras do poder executivo para o poder legislativo. Para os indígenas essa PEC é uma retrocesso na história de luta pelo território, visto que a partir do momento em que o Legislativo decidir pela demarcação das terras indígenas, muito provavelmente não haverá mais demarcações. 

A história indigena no brasil foi construída pelos pilares da luta e sofrimento, suas conquistas mais marcantes são recentes, ou seja, há muito que os povos não índios devem aos povos indígenas. É importante o reconhecimento e a valorização da identidade étnica específica de cada uma das sociedades indígenas em particular, compreender suas línguas e formas tradicionais de organização social, de ocupação da terra e de uso de recursos naturais. É essencial que esses povos tenham seus direitos garantidos e respeitados pelo Estado. Sendo assim, não podemos aceitar que senadores diretamente ligados a setores industriais dezimem a história, cultura e valores de todo um povo. Portanto, temos que ter respeito pelos direitos coletivos especiais de cada uma das etnias e buscar um convívio pacifico através de intercâmbios culturais com os diferentes povos indígenas brasileiros que restam

Saneamento básico e abandono por parte do Estado

Existem 250 etnias indígenas no Brasil, e elas não vivem da mesma forma. De acordo com o IBGE (2012), 36,2 % das etnias indígenas vivem em ambiente urbano. Além disso, o comportamento dos indígenas tem se alterado com o tempo, de forma que passaram a viver em aldeias com maior concentração de pessoas, podendo chegar a aproximadamente 5 mil habitantes. Isso faz com que o saneamento básico assuma um papel cada vez maior na manutenção da saúde e das condições de vida adequadas para esses povos. O acesso e a qualidade dos serviços de saneamento básico podem impactar diretamente sobre os perfis epidemiológicos, exemplificado pela ocorrência de doenças infectoparasitárias. Anualmente, são registradas no Brasil milhares de internações e óbitos por causas relacionadas à ausência ou ineficiência de serviços de saneamento nos domicílios. Entre crianças indígenas, diversos estudos conduzidos em contextos específicos (etnias e/ou terras indígenas) apontam para elevadas prevalências de infecções diarreicas, que constituem cerca de metade das causas de internações hospitalares e até 60% dos óbitos em menores de um ano de idade. Análises com base nos dados do Censo Demográfico de 2010 evidenciam probabilidades substancialmente mais elevadas de morte em indígenas em comparação a não indígenas, de forma particularmente pronunciada na infância, o que é interpretado como decorrente de maior vulnerabilidade histórica e socioambiental desses povos. 

A população indígena é, claramente, negligenciada pelo Estado no que diz respeito ao acesso a saneamento básico: de acordo com o último censo do IBGE (2010), 36,1% dos domicílios indígenas não possuíam banheiro, enquanto que para não indígenas, essa porcentagem era de 6,6%. Existe, claramente, uma deficiência de políticas públicas que sistematizem a construção de estruturas sanitárias adequadas para a vida dessas populações. Em contexto urbano, parte significativa dos indígenas reside em periferias, onde predomina maior precariedade socioeconômica. Esse cenário guarda semelhanças com o que tem sido descrito para outros países da América Latina e Caribe, apontando que pobreza e extrema pobreza configuram-se como situações recorrentes para indígenas residentes em áreas urbanas.Chama a atenção que é na Região Sul, uma das mais bem colocadas no ponto de vista socioeconômico, onde as desigualdades entre domicílios indígenas e não indígenas, em particular nas comparações com os brancos, se mostraram marcantes, ainda mais negativas na Região Metropolitana. Além de bases de dados, como os censos demográficos, faz-se imprescindível que sejam conduzidas investigações, inclusive valendo-se de registros administrativos e outras fontes, que aprofundem o conhecimento sobre os contextos de moradia e disponibilidade de saneamento para os indígenas residentes em áreas urbanas, dado que há evidências de que a urbanização indígena, tal como observado em outros países da América Latina, é um processo em franca emergência na dinâmica demográfica deste segmento da população.

As ações que existem, até hoje, no sentido de fornecimento de saneamento básico de forma específica a populações indígenas partiu da transferência da execução das ações de saúde indígena da FUNAI para o Ministério da Saúde em 1991. Em 1994, com o Decreto Presidencial nº 1.141, foi promovida a divisão de responsabilidades sobre a saúde indígena, cabendo a FUNAI às ações de assistência curativa e à FUNASA, as ações de caráter preventivo, como imunização e saneamento básico. Posteriormente, em 1999, com o Decreto Presidencial nº 3.156, as políticas e diretrizes relacionadas à saúde indígena são transferidas integralmente da FUNAI para o Ministério da Saúde. O decreto de 1991 também regulamentou a criação dos Distritos Sanitários Especiais Indígenas – DSEIs, responsáveis pelas ações sanitárias sobre os territórios indígenas, assim como a organização dos serviços de saúde e da certificação da participação do usuário e do controle social. Além das políticas já mencionadas, o estabelecimento da Política Nacional de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas, estabelecida pela Portaria nº 254 do Ministério da Saúde, de 31 de janeiro de 2002, têm como uma de suas diretrizes a “promoção de ambientes saudáveis e proteção da saúde indígena”. A criação, em 2010, da Secretaria Especial de Saúde Indígena – SESAI, no âmbito do Ministério da Saúde, foi um marco importante, pois surgiu a partir de demandas dos próprios indígenas durante as Conferências Nacionais de Saúde Indígena. A SESAI é a área do Ministério responsável por coordenar a Política Nacional de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas. A atuação da SESAI traz como um de seus benefícios a gestão descentralizada, com autonomia administrativa, orçamentária e financeira, a partir dos Distritos Sanitários Especiais Indígenas.

Relação da saúde indígena com a atenção primária

No Brasil, o direito à saúde pleiteado pelos povos indígenas dialoga com diferentes marcos regulatórios, incluindo a Declaração de Alma-Ata, a qual propõe e valoriza a atenção primária à saúde (APS) como promotora de maior acesso e forma de minimizar as desigualdades em saúde. No âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS), o subsistema de atenção à saúde indígena (SASI) e a Política de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas (PNASPI) foram criados como estratégias para garantir o acesso à saúde aos povos indígenas. A PNASPI prevê atenção diferenciada às populações indígenas com base na diversidade sociocultural e nas particularidades epidemiológicas e logísticas desses povos e focando no desenvolvimento da APS com garantia de integralidade da assistência. Apesar dos crescentes recursos financeiros disponibilizados para implementar o subsistema de saúde indígena, as ações têm apresentado poucos resultados nos indicadores de saúde, que refletem desigualdades historicamente descritas entre esses povos e as demais populações brasileiras. A descontinuidade do cuidado, somada à carência e alta rotatividade de profissionais, assim como a necessidade de estabelecer diálogos interculturais que promovam a articulação com saberes tradicionais, são fatores que desafiam a efetividade da PNASPI. 

Anteriormente à reformulação da Constituição brasileira, em 1988, os povos indígenas eram tutelados pelo Estado. Essa postura impedia que esses grupos protagonizassem as tomadas de decisão de acordo com suas reais necessidades. Assim, a Constituição de 1988 teve grande impacto sobre a criação de políticas públicas voltadas aos povos indígenas, considerando a iniciativa de retirar de seu texto a tutela estatal, para torná-los cidadãos de fato e de direito. Entre os direitos concedidos está a garantia de atenção diferenciada à saúde. Sendo assim, cabe aos governos, em conjunto com as práticas de participação social, estabelecer normas e políticas que regulem estratégias para reduzir as iniquidades e desigualdades relacionadas à saúde. Essas iniciativas, com base na situação local, devem promover a integralidade da assistência, compreendendo o acesso aos serviços e aos cuidados de diferentes profissionais, incluindo os “praticantes tradicionais”.

Aprofundando um pouco mais sobre a criação e a atuação da PNASPI, essa política deveria ser implementada de acordo com os princípios do SUS, dando ênfase à descentralização das ações e dos recursos e a universalidade, integralidade, equidade e participação social, com destaque para as questões relacionadas à diversidade cultural, étnica, geográfica, epidemiológica, histórica e política. Como modelo organizacional, foram criados os Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEI). Ao todo, são 34 no país, havendo, dentro desses, outras instâncias responsáveis pela assistência à saúde em diferentes níveis, como os pólos base, as unidades ou postos de saúde e as casas de saúde indígena.

Em 2010, foi aprovada a criação da Secretaria Especial de Saúde Indígena (SESAI). O que sua criação traz de novo é, em última instância, a existência de um órgão responsável unicamente pela saúde indígena, que até então havia sido coordenada por setores dentro de outros órgãos ou instituições que tinham atribuições mais amplas, por vezes sequer limitadas aos povos indígenas. Nesse novo formato, contudo, não estão ausentes os desafios operacionais, uma vez que, dentre as secretarias diretamente ligadas ao Ministério da Saúde, a SESAI é a única que contempla simultaneamente responsabilidades tanto pela gestão como pela execução das ações e programas de saúde, o que exige do órgão uma robusta estrutura administrativa.

No entanto, mesmo que os dados indiquem uma evolução significativa e consistente dos recursos financeiros aprovados e executados, não é possível falar em melhora proporcional dos indicadores de saúde. A despeito de uma relativa escassez de dados demográficos e epidemiológicos sobre os povos indígenas do país – quando comparados aos dados disponíveis para o restante da população brasileira – é evidente o quadro de marcantes desigualdades que persistem após quase 20 anos de existência do subsistema. Alguns importantes indicadores, como a mortalidade geral, materna, número de internações e óbitos por doenças respiratórias e doenças infecciosas e parasitárias na infância e doenças transmissíveis colocam a saúde indígena em franca desigualdade. Aponta-se, ainda, para a importância crescente das doenças crônicas não transmissíveis para os povos indígenas, além de precárias condições sanitárias e taxas elevadas de internação de crianças por diarreia e infecções respiratórias, o que indica a baixa resolutividade das ações na APS.

Alguns autores têm descrito a presença de estruturas de saúde precárias e insumos e equipamentos escassos que, somados à alta rotatividade de profissionais e à complexidade logística encontrada em algumas regiões, têm reflexos negativos na qualidade da prestação de serviços dentro dos territórios indígenas. Cuidados paliativos e atenção emergencial têm sido priorizados, caracterizando o enfraquecimento da APS. Em relação à alta rotatividade dos profissionais, o não estabelecimento de vínculo tende a inviabilizar o reconhecimento das especificidades culturais que permeiam o cuidado em saúde desses povos.

Embora desejável, um balanço categórico do processo de implementação da PNASPI no Brasil mostra-se pouco produtivo, e talvez nem sequer factível. Houve, por certo, avanços importantes, com ganhos reais no cenário da saúde indígena no país. No entanto, em termos gerais, os dados disponíveis seguem apontando para enormes distâncias entre o que a PNASPI prevê e a precariedade com que a mesma se concretiza no cotidiano vivido pelos povos indígenas. Se, por um lado, é possível afirmar que, a despeito de todas as dificuldades enfrentadas a partir da criação do subsistema de saúde indígena, a Política teve impactos positivos no cenário da saúde indígena no país, é também verdadeiro que os impactos foram limitados.

Apesar de a estruturação e construção da PNASPI corroborarem as propostas descritas na Declaração de Alma-Ata, pensando a APS como estratégia para viabilizar o direito à saúde através do acesso, com vistas a reduzir as desigualdades, estimulando a participação social e a formação dos profissionais, assim como a manutenção do vínculo entre esses profissionais e sua população adstrita, podemos analisar que, de maneira integral, essa APS não se efetiva.

FONTES: 

https://etes-sustentaveis.org/saneamento-comunidades-indigenas/#:~:text=Infelizmente%2C%20os%20ind%C3%ADgenas%20s%C3%A3o%20mais,rela%C3%A7%C3%A3o%20aos%20povos%20n%C3%A3o%20ind%C3%ADgenas.

https://scielosp.org/article/csp/2019.v35suppl3/e00058518/

https://www.scielosp.org/article/rpsp/2018.v42/e184/pt/

https://inacio45.jusbrasil.com.br/artigos/182212231/um-olhar-antropologico-sobre-os-povos-indigenas-do-brasil-e-sua-luta-por-reconhecimento-na-sociedade

Anemia e desnutrição

Os estudos realizados no Brasil, reunidos em recentes revisões de literatura mostraram que a anemia ferropriva pode ser considerada a mais importante carência nutricional do país, com prevalências sempre superiores em populações em evidente condição de iniquidade social. Apesar da grande deficiência no monitoramento da anemia em povos indígenas no cenário mundial, estudos relatam que as prevalências são maiores do que as observadas nas populações não indígenas, sendo relacionadas às condições inadequadas de vida, dieta insuficiente em ferro e outros micronutrientes essenciais e elevadas taxas de doenças infecciosas. O único estudo de âmbito nacional com povos indígenas já realizado no país, o I Inquérito Nacional de Saúde e Nutrição dos Povos Indígenas no Brasil, de 2008-2009, confirmou a anemia como relevante agravo no cenário epidemiológico para crianças e mulheres indígenas.

 De acordo com a Organização Mundial da Saúde, as prevalências superiores a 40% colocam a anemia como grave problema de saúde pública entre povos indígenas no Brasil. Considerada um indicador de situações precárias de saúde e nutrição, a anemia é associada ao risco aumentado de mortalidade infantil e materna, a consequências negativas para o desenvolvimento físico e cognitivo de crianças e à baixa produtividade de adultos. Em estudos de revisões sistemáticas, os fatores mais associados à presença de anemia nas crianças são idade, baixa escolaridade materna, baixo nível socioeconômico, déficit de peso e estatura em relação ao padrão, diarreia, baixa densidade de ferro na dieta e densidade de calorias provenientes do leite de vaca. 

A investigação sobre o perfil nutricional em crianças indígenas Suruí realizada há mais de 25 anos constatou elevada prevalência de anemia, baixo peso para a idade, déficit de crescimento e infestações parasitárias. Este quadro foi atribuído à falta de tratamento da água, aos dejetos, à remoção de lixo e à alimentação inadequada, resultantes da redução da capacidade de produção de alimentos tradicionais, da monotonia alimentar e do consumo de alimentos industrializados. Após duas décadas, o perfil nutricional de crianças Suruí foi novamente investigado e, apesar de uma sutil diminuição da desnutrição, a prevalência de anemia manteve-se inalterada.

Na mesma época, também foi observada em crianças Kamaiurá, do Alto Xingu, alta prevalência de anemia. Neste caso, a presença acentuada de anemia foi atribuída à elevada proporção de infecções parasitárias que acometiam a localidade. Para os autores, o aleitamento materno até os dois ou três anos somado à alimentação complementar inserida somente ao final do primeiro ano de vida e composta basicamente por peixe, mingau de mandioca e beiju umedecido, pode ter favorecido a elevada prevalência (81,3%) de anemia nas crianças Kamaiurá menores de 24 meses.

Ainda que elevada, a menor prevalência de anemia (29,6%) em crianças indígenas com menos de cinco anos foi identificada entre as Xukuru do Ororubá, de Pernambuco. Os resultados do Inquérito Indígena para a região Nordeste também registraram as menores prevalências (40,9%) em comparação às demais regiões do Brasil. Por outro lado, as prevalências reportadas da PNDS/2006-2007 mostraram que nesta região estavam concentradas as maiores prevalências de anemia em mulheres e crianças não indígenas, 39,1% e 25,5%, respectivamente. Os povos indígenas da região Nordeste representam uma parcela expressiva do contingente indígena no país, porém ainda são escassas as publicações que abordem as questões de saúde e nutrição destes povos.

Os estudos que também realizaram a avaliação antropométrica, indicaram elevadas prevalências de desnutrição, especialmente no que tange ao déficit de crescimento. As situações mais favoráveis foram observadas entre as crianças Panará, Xukuru e Teréna, embora não tenham interferido nos resultados desfavoráveis quanto a anemia nestes povos. A avaliação da saúde realizada com os índios Panará, que vivem no sul do Pará, encontrou uma situação mais favorável no que diz respeito à anemia, quando comparada a de outros povos indígenas.

Entre as mulheres indígenas, considerando todas as faixas de idade incluídas nos estudos, o perfil de anemia observado também coloca este seguimento populacional em uma situação vulnerável, a exemplo dos estudos com as Suruí. Nestas, foram observadas prevalências globais elevadas para gestantes (67,3%) e não gestantes (81,8%). De fato, as mulheres, durante seu período reprodutivo, possuem uma demanda alta por nutrientes hematopoiéticos e, quando não estão grávidas ou lactantes, as perdas menstruais regulares constituem uma depleção constante de nutrientes que devem ser repostos. Esses fatores, juntamente com a carência dietética e a dificuldade de absorção, podem levar a um desequilíbrio, ocasionando deficiência de ferro e anemia.

Os determinantes dos agravos nutricionais nos indígenas estão relacionados a inúmeras transformações de ordem demográfica, socioeconômica, cultural, ambiental e no seu perfil epidemiológico. Em muitas comunidades indígenas, a subsistência a partir de atividades de caça, coleta e pesca vêm ao longo dos anos passando por transformações decorrentes principalmente da instalação de novos regimes econômicos e da diminuição dos limites territoriais, levando frequentemente a uma situação de empobrecimento da dieta.

Segundo estudos, a frequência elevada de anemia entre as crianças menores de 2 anos tem forte relação com a demanda de ferro aumentada para atender o rápido crescimento e desenvolvimento nos primeiros anos de vida. A interrupção precoce do aleitamento materno antes dos 6 meses, associados à introdução de alimentos com baixa disponibilidade de ferro e vitamina C, é um fator que parece contribuir por agravar os casos de anemia, já que dificulta atingir a recomendação diária de ferro. Assim como a alimentação complementar precoce, o consumo de leite de vaca também é relatado em algumas investigações como um fator de risco para o desenvolvimento da doença, podendo levar a microsangramentos na mucosa gástrica. Além do mais, o cálcio presente no leite age inibindo a absorção de ferro. O aleitamento materno exclusivo é preconizado pois protege o bebê contra diversas doenças, inclusive a anemia. 

A desnutrição pode ou não apresentar relação estatisticamente significante com anemia. Analisando dados de dois inquéritos sobre a epidemiologia da anemia no estado de São Paulo, revelou-se que melhorias nas condições de renda e na disponibilidade de alimentos não foram capazes de promover uma redução nos indicadores de anemia, ao contrário do que ocorreu com a desnutrição. A desnutrição vem reduzindo suas prevalências nos últimos anos, ao passo que a anemia vem aumentando sua frequência consideravelmente, uma vez que entende-se que a anemia está mais associada com a qualidade nutricional do que com a disponibilidade de alimentos.

Entre os fatores de risco para o desenvolvimento da doença também estão: mulheres na idade adulta (reprodutiva), pelas perdas de ferro recorrentes na menstruação, adolescentes mulheres, devido às perdas na menarca e ao estirão de desenvolvimento que aumenta a demanda por ferro, gestantes, devido à necessidade de suprir o feto, pessoas, principalmente homens, mais idosos, devido à presença de doenças crônicas, renais e inflamatórias.



FONTES: 

Doenças infecciosas e parasitárias (Tuberculose e Malária)

 

Um estudo inédito sobre a tuberculose (TB), segundo o quesito raça/cor, revelou que os indígenas apresentaram as maiores taxas de incidência da doença no Brasil durante o período de 2008 a 2011, com incremento de cerca de 10% de novos casos. No período de estudo foram notificados 278.674 casos novos no Brasil, o que corresponde a uma incidência média de 37/100.000 habitantes. A análise, que teve como fonte de dados os casos novos de TB notificados pelo Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan), contemplou todo território nacional e suas macrorregiões, as variáveis sociodemográficas (sexo, faixa etária, escolaridade e zona de residência) e clínicas (forma clínica, exames complementares empregados para o diagnóstico e coinfecção tuberculose/HIV), além de indicadores de desempenho do programa de tratamento – todos com base no quesito cor/raça. O estudo conclui que as taxas de incidência de TB parecem estar mais estreitamente relacionadas com os determinantes sociais e econômicos, tais como o índice de desenvolvimento humano, o acesso ao saneamento e mortalidade infantil do que simplesmente o sucesso do Tratamento Diretamente Observado. “Podemos constatar que as taxas de incidência de TB distribuem-se de maneira bastante heterogênea ao longo do país, sendo registradas importantes disparidades regionais e étnico-raciais”, afirmou o autor da pesquisa.

 

O impacto sobre as populações indígenas tem sido de grande importância, e diversos estudos revelam que permanece elevado o grau de exposição ao Mycobacterium tuberculosis entre essas 13 populações no decorrer dos anos. Em linhas gerais, os coeficientes de incidência são 10 vezes superiores aos observados nas populações não indígenas.

 

Ao analisarem os registros da doença disponíveis nos DSEI brasileiros, pesquisadores sugerem que o processo de integração dos povos indígenas à sociedade nacional transformou a TB em doença de difícil controle entre este segmento da população, como demonstram as altas incidências reportadas. Segundo esses autores, atividades de mineração, agricultura, pecuária, extração de madeira, entre outras, aliadas ao intenso intercâmbio de pessoas entre as cidades e as aldeias, contribuíram no passado, e ainda hoje, incumbem-se de disseminar a TB entre os indígenas no Brasil. 

 

A Amazônia é a região de mais alta endemicidade da malária. A situação presente entre as populações indígenas do Brasil está intimamente associada à problemática da endemia nas populações "brancas". Toda a Amazônia vem recebendo o impacto de grandes programas desenvolvimentistas. Dessa forma, vários municípios da Amazônia Legal são cenários de implantação de grandes projetos agropecuários, os quais atraem numerosos contingentes migratórios de regiões não mais endêmicas. Assim, populações humanas, sem nenhuma resistência aos parasitas e sem outro tipo de proteção, vão ser alvo, como no passado, de infecções maciças e constantes dos surtos epidêmicos de malária. Acrescente-se, ainda, quando se constata a reintrodução da parasitose nas regiões em que ela foi controlada ou erradicada. Esses problemas de natureza eminentemente social decorrem, entre outros fatores, do fato de que, não encontrando trabalho, grandes contingentes humanos que vão à Amazônia e retornam às suas origens, estando infectados, reintroduzem a doença em locais distintos, onde já havia sua erradicação.

 

Atualmente, os grupos indígenas em que a malária está melhor estudada encontram-se no Parque Nacional do Xingu (PNX). Estes grupos estão em contacto intermitente com a "civilização" i.e., as relações com o "branco" estão restritas ao pessoal da FUNAI, missionários e alguns pesquisadores. Ressalta-se, no entanto, que nas regiões onde vivem grupamentos indígenas não existem estudos suficientes para caracterizar e avaliar o quadro epidemiológico particular de cada área. 

 

Textos-base:

https://www.unasus.gov.br/noticia/populacao-indigena-apresenta-maior-taxa-de-incidencia-de-tuberculose

 

http://bvssp.icict.fiocruz.br/lildbi/docsonline/get.php?id=5651

 

https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-311X1985000100004

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